Edson Gomes: “Exatamente pela carência do público de ouvir algo de qualidade, que desperte a curiosidade, que desperte a mente”
No próximo sábado (11), o cantor de reggae Edson Gomes celebra meio século de carreira, no Luau Manguinhos, que será realizado no espaço Chico Bento, na Serra.
Quem for ao show do ícone nacional do Reggae Resistência, que marcou gerações e carrega uma legião de fãs por todo país, vai conferir e cantar junto clássicos como “Árvore”, “Camelô”, “Liberdade” e “Malandrinha”.
Aos 67 anos, o cantor natural de Cachoeira, no recôncavo baiano promete, junto da banda Cão de Raça, um show inesquecível e repleto de boas vibrações.
Edson Gomes se intitula um pensador solitário, recusando rótulos e carrega no repertório um legado de sabedoria. Ele garante que sua música é o que o posiciona “politicamente”.
Para celebrar esse momento marcante da música brasileira, que vai ser realizado no próximo sábado, a reportagem do grupo Política Capixaba conversou com o cantor sobre a apresentação, sobre o mercado musical, sobre os rumos da carreira e, por que não, sobre política.
Confira a entrevista:
O que o público capixaba pode esperar dessa apresentação que marca os seus 50 anos de carreira?
Depois de tanto tempo na estrada, não há novidades em minhas apresentações. Vamos tocar os hits que a galera canta junto, que a galera sente as mensagens. Esse é o teor do meu trabalho.
As pessoas cantarem junto, sentirem a minha mensagem, alimenta meu trabalho. Essa recíproca de se apropriarem da música, tomando a canção para si, faz com que o artista sinta-se vitorioso.
Por isso, quero convidar o pessoal do Espírito Santo para esse show que marca meus 50 anos de carreira, de reggae e de resistência. Resistência que vem de Deus. Que vem da paz de jah!
Consegue estimar quantas apresentações já fez no Espírito Santo? Se lembra da primeira vez em que tocou em terras capixabas?
Venho tocar no ES desde a década 90. Fiz dezenas de shows. Toquei dezenas de vezes. O que me marca do Espírito Santo é que desde o início da minha carreira, muito antes de fazer algum tipo de sucesso, o povo daí aceitou e acolheu minha música. Essa resposta agradável do público capixaba me impressionou.
Fale sobre a banda que o acompanha.
Qualquer banda sempre sofre mudanças, ainda mais com 50 anos de carreira. As minhas músicas tem um estilo definido. Quem toca comigo segue o estilo, mas também acrescenta suas características. O contrabaixo, por exemplo, segue mesma linha, mas o músico acrescenta melhorias, inserindo mais notas. Ao longo dos anos melhoramos a qualidade da metaleira, que está mais segura, mais consciente. A bateria segue a mesma evolução, ganhando qualidade, sem perder a característica do reggae raiz.
O público pode esperar novidades de estúdio?
Tenho um plano antigo de entrar no estúdio para gravar. Música é o que não falta. No youtube tem muitas canções minhas inéditas. Com a quantidade de músicas que eu tenho prontas, daria para gravar até três discos.
E sua agenda de shows?
Antes da pandemia eu fazia poucos shows. Até me impressionei. Nunca tive agenda definida, uma agenda cheia. Dia 13 de março vou tocar em Cachoeira, na Bahia, no aniversário da minha terra Natal. Até julho, já tenho shows marcados em Pernambuco, Sergipe, Bahia e São Paulo.
Diante das oscilações do mercado, das novidades de estilo, a que atribui a sobrevivência do seu Reggae?
Eu particularmente, gosto mesmo é do Reggae. Aprecio boas composições. Mas gosto mesmo é de ouvir Reggae. Gosto de algumas bandas como a Tribo de Jah, a banda Vibrações, de Alagoas, Planta e Raiz.
Exatamente pela carência do público de ouvir algo de qualidade, que desperte a curiosidade, que desperte a mente. O mercado musical está nivelado por baixo. A nova geração não diz nada para as pessoas. Não há nada que se assemelhe ao que público quer realmente sentir. Não há nada que se identifique, que dialogue com a alma. Devido a isso que eu sobrevivo com a minha música. Devido justamente a essa falta de concorrência.
Qual a sua opinião a respeito do conteúdo das músicas e dos valores que fazem sucesso atualmente?
O que eu vejo é que o conteúdo é zero. Os grandes compositores sumiram. Tomaram de assalto a música brasileira. Veja o que estão fazendo com a música brasileira. Mas continuarei falando com o coração das pessoas.
A música brasileira se tornou apenas algo para dançar. Não há literatura, não há poesia. O discurso praticamente não existe. Talvez por isso, que depois da pandemia, quando as pessoas pararam para refletir, algumas retomaram alguns valores musicais, alguns conceitos.
E tem a rede social que é um campo aberto, mas mesmo com a rede, nem todo mundo tem um celular bacana e mesmo tendo, não acessa para ouvir música. O que prevalece ainda é força das emissoras, dos grandes grupos de comunicação, que ao contrário do que se pensa, ainda ditam as tendências. O pobre ainda ouve muito rádio e é bombardeado com o que o mercado define. A audiência prevalece sobre a qualidade.
Suas músicas são politizadas, de conteúdo abrangente e profundo. Acha que ainda há espaço para esse tipo de canções?
O fenômeno de não haver música boa no grande circuito acontece, dentre outras coisas, devido a oportunidade que não é dada aos artistas que tem coisas boas para dizer.
Mas há um outro fenômeno, que ocorre ao longo desses anos todos, por meio da oralidade, de disco em disco, de fita em fita, cd em cd. De pai para filho. A necessidade de curiosidade, de buscar ouvir algo que desperte a mente ainda sobrevive nas pessoas.
Importante salientar que nos meus shows, há muito jovens. Acontece um encontro de muitas gerações. Por incrível que pareça, meu trabalho está vivo, mesmo não sendo pautado nas programações de cultura dos governos, da grande mídia.
O senhor se sente a vontade para falar sobre política, sem ser por meio das canções? O que o senhor pensa a respeito dessa polaridade política, que dividiu os brasileiros entre eleitores de um ou outro partido?
Eu não gosto de politica. A política divide. Andaram me provocando nas redes sociais para eu me posicionar entre esquerda e direita. Mas minha música já me posiciona. Não estou nem de um lado e nem de outro lado. Estou do lado de Deus. Esse é meu discernimento. Não queira me posicionar em nenhum desses polos. Minha luta é pelo povo e vou continuar lutando pelo povo, haja o que houver. Nessa altura da vida, aos 67 anos não há mais o que esperar de crescimento musical. Mas a minha luta de levar uma mensagem positiva, nunca para.
O panorama político que se formou depois das últimas eleições te deixam otimista?
Nunca fui às urnas com um olhar otimista. A política nunca me deixou otimista. Não acredito no homem. Não espero nada politicamente bom da natureza do homem. O que posso dizer é que se pode, no máximo, escolher um candidato com boas propostas. O povo precisa ter esse discernimento.
Carlos Mobutto | Jornalista da AZ
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